terça-feira, 14 de dezembro de 2010

O Aprendiz de Feiticeiro


Uhul, primeira postagem! Vou me divertir com este daqui usando aquele tão bem conhecido sadismo humano de que gosto tanto!



O Aprendiz de Feiticeiro é o mais recente filme dirigido por Jon Turteltaub - não precisa fingir que sabe pronunciar, o seu palpite é tão bom quanto o meu -, de quem você pode se lembrar por "A Lenda do Tesouro Perdido", apesar de que não seria tão "pode" quanto "vai", já que a tagline deste aqui toma cuidado em te lembrar.

O filme começa nos dando a sua versão da história de Merlim (James A. Stephens) e seus aprendizes Horvath (Alfred Molina), Balthazar (Nicolas Cage) e Veronica (Monica Bellucci), na luta contra Morgana le Fay (Alice Kridge), a Grande Vilã deste filme, ou a quem você deveria culpar pela fome na África aparentemente, já que a trama nunca toma a iniciativa de especificar por que ela é má. Durante o confronto final com seu inimigo, Merlim é traído por Hovarth que dá a deixa para que Morgana o fira mortalmente antes que seus outros dois aprendizes possam detê-la; enquanto Morgana prepara-se para matar Balthazar, ela é impedida por Veronica que absorve o espírito daquela para dentro de seu próprio corpo, o que não só é uma ideia tão estúpida quanto parece, já que o feitiço sai pela culatra quando a vilã toma posse do corpo da heroína. Para evitar que Morgana provoque a morte de Veronica de dentro de seu próprio corpo, Balthazar confina a ambas dentro de um receptáculo mágico, selando os seus poderes em uma dimensão paralela. Merlim, à beira da morte, alerta Balthazar sobre a vinda de seu sucessor: uma criança que herdará todos os poderes do mago caído, hábil o bastante para derrotar Morgana pondo fim à sua existência destrutiva, e que poderá ser encontrado através do reconhecimento de um anel dado a Balthazar, que permitirá à criança o acesso ao seu potencial mágico.

Não contente apenas com esse reuso de um preâmbulo saturado para RPGs baratos, o filme procede em aplicar todo tipo de artifício clichê que estiver em sua alçada, tais quais os eventos contínuos de onde nada é uma coincidência; a habilidade excepcional em magia, desenvolvida por uma pessoa nunca antes introduzida aos conceitos básicos, para derrotar a feiticeira mais poderosa do mundo em míseros três dias de aprendizagem; um romantismo improvisado para enchimento de linguiça com uma péssima execução; e a arte maravilhosa das piadas irrisíveis, que te farão indagar se não foi um script de circo trocado com o roteiro por engano.

Após milênios em busca do Primeiro Merliniano, ou qualquer que seja a forma ridícula com que o chamam, Balthazar finalmente encontra o pirralho Dave Stutler (inicialmente interpretado por Jake Cherry), quando uma série de infortúnios envolvendo uma ventania demasiadamente específica leva o garoto à loja de antiguidades do mago em busca de um bilhete perdido, o que leva o mestre-feiticeiro Balthazar, com centenas de anos de experiência em lidar com a estupidez humana, à conclusão de que a única coisa que poderia ter dado efeito àquela série de coincidências é o destino. Se a sequência de demonstrações que o roteirista faltou a aula de causalidade não lhe for sinal suficiente de um enredo pedindo socorro, espere até que Balthazar deixe uma criança de dez anos sozinha em posse de um anel com poderes divinos, na presença do receptáculo que reage a cada movimento do mesmo e agora se encontra repleto de bruxos perigosíssimos, presos em suas camadas exteriores ao tentarem libertar sua mestra de vossa prisão acrílica.

Alguém presumiria que mil anos pudessem por um pouco de senso na cabeça do feiticeiro, mas esse obviamente não é o caso; e já que a vida é cheia de surpresas, logo o primeiro bruxo libertado da caixinha de pandora é Horvath, o X9, que encara seu antigo aliado em um luta desenfreada pelo MacGuffin cilíndrico e acaba preso dentro de outro jarro quando Balthazar, numa tentativa desesperada de contê-lo, aprisiona ambos a si e Horvath dentro de um dos seus vários potes de barro e terracota espalhados pela loja. Molina não tem paz neste filme...

Dez anos depois, o garoto cresceu e virou um... Garoto grande, normalmente o certo seria chamá-lo de adulto, mas seu comportamento não é adequado ao título; e além do mais, alguém poderia ir longe ao ponto dizer que o Dave de 10 anos era muito mais maturo que a sua contraparte de 20. O garoto agora está na faculdade onde nós somos introduzidos a Becky (Teresa Palmer) e uma tonelada de diálogo expositório sobre os ocorridos que se sucederam aos daquele incidente na loja de Balthazar; resumidamente: Dave contou a todos sobre aquela história de magia, obviamente ninguém acreditou, então eles arrancaram um de seus testículos como punição por contar mentiras e o deram de comida ao cachorro da família enquanto o garoto assistia impotentemente. Bom, o desenrolar não ocorreu exatamente dessa forma, eles simplesmente tiveram um psiquiatra para enfiar uma grotesca quantidade de besteira na cabeça da criança, até o ponto em que ele já acreditava que o Coelhinho da Páscoa entrega ovos de chocolate às pessoas usando um pula-pula equipado com um hiper-propulsor capaz de acelerar a 98.000 vezes a velocidade da luz.

Mas você tem que admitir: a minha versão é bem mais divertida; mas eu divaguei.

Como você deve imaginar, Becky é o interesse amoroso de Dave neste filme, e a dona do bilhete que levou o rapaz até a loja de Balthazar naquele fatídico dia.

Enquanto isso, a Trama então cutuca a minha cabeça com a bengala de Hovarth para me chamar de volta à realidade bisonha que é esta bagunça de filme; o vaso onde Horvath e Balthazar foram aprisionados libera os dois imbecis por terem cumprido com os dez anos de confinamento arbitrariamente estipulados e apenas explicados agora. Horvath, que escapou primeiro, parte em busca do garoto por sua única pista válida do paradeiro do receptáculo, mas não antes de atirar o vaso que dividira nos últimos 10 anos com Balthazar pela janela do 10° andar enquanto este ainda se materializava da boca do pote, uma ação que recebe as minhas mais sinceras congratulações. Ao encontrar o bruxo malvado em sua casa, Dave foge para uma estação de trem onde ele é salvo por alguns truques espertos de Balthazar, que parece finalmente ter acordado pra vida. Ele leva Dave a um lugar seguro onde possam conversar, e procede a realinhar o enredo na posição em que estava ao se conhecerem dez anos no passado, o que, por sinal, torna o Timeskip completamente inútil. Talvez a Disney achasse que um personagem mais velho seria uma escolha melhor em caso dele precisar matar alguém e para desenvolver o romance bobo que se seguiria, quando Dave começasse a lamber os pés de Becky em busca de uma chamada erótica, mesmo contra as recomendações de seu recém-adquirido mestre Balthazar; não que ele tenha tomado muitas ações sábias até agora, é claro, mas enfim...

Após isso, o filme sai quicando por todo lado da sala, indo de uma cena de ação a uma cena de aula de magia com Balthazar e Dave; às interações entre ele e Becky e o porquê de ter jogado fora o "Screenwriting for Dummies" não ter sido uma boa idéia para o roteirista, considerando que tenha havido alguma que não fosse ruim; aos vilões planejando o próximo ataque com a astúcia de um Chapolim Colorado doidão de craque no País das Maravilhas; e repetindo essa formula até o momento do clímax. É uma formula estranha, dá a ligeira impressão de que algumas das cenas poderiam ser alinhadas sob qualquer tipo de ordem que a diferença ao final seria negligível.

Jay Baruchel, que interpreta o titular aprendiz de feiticeiro do Timeskip em diante, possui um desempenho no mínimo estranho. Ele tenta criar uma imagem de "everyman" para o seu personagem, falhando, porém, ao confundir um homem comum e inseguro com um sobrevivente de derrame cerebral. Suas empreitadas românticas não melhoram em nada a situação, já que sua relação com Becky não é tão romântica quanto é desajeitada e embaraçosa; ao invés de adquirir química e simpatia da audiência, a única coisa que estes dois vão fazer é te irritar a um nível quase insuportável. Maior atrocidade que os momentos românticos do protagonista há apenas a triste insistência do roteirista em transformar magia numa espécie de ciência, com explanações cada vez mais tediosas para truques simples quebrando o ritmo da ação ao desmontar a coisa em uma pífia tentativa de se fingir original. Não me entenda mal, não há nada como um bom tecnobabelismo para me divertir em uma série de ficção cientifica, mas esse tipo de coisa não tem muito espaço em fantasia; e enquanto isso até pode ser feito, este filme não tem o melhor exemplo.

Já em contrate, o resto do elenco - Cage e Molina no caso, já que ninguém mais tem uma participação lá de muita importância -, são bastante agradáveis de ver, sempre deixando a audiência a indagar pelo que farão a seguir - mesmo que o personagem de Cage tenha seus momentos de brilhante estupidez -, e que basicamente carregam o enredo todo do filme nas costas; enredo este que não é muito consistente, tendo sido construído sobre pilhas de clichês de que já estamos cansados de ver ser repetidos, de novo e novamente, em todo épico que aparece aos finais de semana.

Ao final, Morgana, libertada por Horvath depois de sacrificar cada aliado maligno que conseguiu durante o filme e que não são suficientemente interessantes para serem mencionados aqui, está se preparando para liberar todo o seu Phlebotinum Magico e trazer os mortos de volta a vida para... Não sei, dominar o mundo, talvez, quem se importa, o filme está quase no fim! Isso obviamente força Dave a agir. Ele bola um plano deveras original para alguém que mal consegue finalizar uma oração sem gaguejar e bufar umas três mil vezes, que ele usa para derrotar Hovarth; parar a magia negra de Morgana; salvar a mina do Balthazar - sim, Veronica e ele se gostam também, pelo que parece -; matar a bruxa maligna com táticas de batalha tão previsíveis quanto um filme de fantasia ruim pode ser pretensioso; e TRAZER A PORRA DO BALTHAZAR DE VOLTA A VIDA, pois este havia sido ferido ao confrontar Morgana. Tudo em uma noite de serviço!

Dave é o nosso herói! Mal posso esperar para ver as fanfics Gary Stu que vão escrever a seu respeito na internet, talvez alguma se saia melhor que o roteiro deste pedaço de merda.

TL; DR
O filme é levemente divertido, suas cenas de ação são bem elaboradas e a apresentação CGi não deixa nada a desejar, porém, o constante lembrete de sua estupidez feito sempre que o casal romântico aparece - ou quando o protagonista abre a boca, juntamente com o caminho tortuoso e implausível que toma a trama a cada guinada, tornam o que poderia ser um filme muito mais interessante em algo irritante, esquecível e insípido.

É só uma pena que o especialista em efeitos também não tenha dirigido o filme.

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